segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Ensinamos o respeito ou a vergonha?


O post de hoje é muito sério. Mesmo! (Em verdade, quero acreditar que todos os outros também!) E para mim é sério porque dei conta que passamos pelos dias e pelos acontecimentos muitas vezes amorfos, pouco atentos, deixando passar o que se faz há anos, só porque sim. Sei que o assunto de que vos vou falar hoje pode ter opiniões diversas, mas esta é a minha. E se de algum modo fizer reflectir, fizer questionar algumas crenças, já me dou por satisfeita!

Tive conhecimento há pouco tempo que o colégio que a minha filha frequenta (e do qual tenho muito boa opinião na abordagem geral aos alunos - daí o meu espanto) afixa, em local visível para toda a comunidade educativa (no interior do colégio), uma lista com o nome dos alunos que têm falta de repreensão ou disciplinar, com um breve resumo do acontecimento. Claro que este prática é o culminar de todo um processo (de conversa com aluno, encarregados de educação, etc) e que a intenção  que a sustenta é o facto de os outros alunos entenderem que existe alguma "justiça" e "controlo" no que acontece no ambiente escolar, para que se sintam livres mas também protegidos (e acredito eu que a intenção seja também "dar o exemplo" e evitar acontecimentos futuros).

Ao partilhar esta situação com alguns amigos, tive conhecimento que em alguns colégios esta prática é ainda mais dramática - fazem passar por todas as salas um documento que é lido a todos os alunos, explicando a falta disciplinar, o que tinha acontecido e qual o aluno em questão. Confesso-vos que estas situações só me fizeram lembrar o que se praticava antes, quando se colocava os alunos com orelhas de burro em frente a toda a sala! (Não queria acreditar, mas infelizmente acredito, que em algumas salas algo muito parecido com isto ainda acontece).

Estes colégios têm milhares de pais e daquilo que percebo muito poucos questionam esta prática. Enquanto mãe (de algum modo imparcial porque nenhum dos meus apareceu nessas listas) senti-me na obrigação de partilhar a minha opinião com o colégio (processo ainda a decorrer com alguma abertura por parte da direcção. Mesmo que o resultado seja o mesmo, a reflexão já está a existir.)

E é a minha visão sobre este tema que quero partilhar hoje convosco:

Entendo que tenha que haver, no âmbito do regulamento do colégio e do bom funcionamento do mesmo, algumas acções correctivas daquilo que são consideradas atitudes menos correctas, desrespeitadoras e desestabilizadoras. Como em qualquer casa, em qualquer empresa, em qualquer escola, estas situações têm que ser analisadas, avaliadas com cuidado (não só os comportamentos mas também as causas) e tomadas medidas que ajudem a um ambiente mais harmonioso. O que questiono não é isso. Devem haver limites, comunicados de forma clara e assertiva. Pode haver repreensão/ chamada de atenção/ consequências a determinado tipo de comportamento. No entanto, em toda a minha vida profissional aprendi que "os elogios devem ser públicos, as repreensões devem ser em privado" e com esse lema acredito obterem-se os melhores resultados. Se não fazemos isso aos adultos, porque fazemos às crianças?
A exposição "pública" das situações a outros alunos traz, na minha opinião, algumas consequências menos benéficas:
- Ao aluno que cometeu a falta, traz muitas vezes a vergonha, a exposição ao ridículo. A vergonha pode ter um efeito momentâneo de controlo do comportamento, mas não ensina ao respeito e à empatia com os outros. Existem vários estudos que indicam mesmo que a vergonha pode ser a causa subjacente a um comportamento difícil. A vergonha pode ser encarada como o julgamento de alguém com mais poder do que a criança/aluno. O que pode fazer com que recuperem esse poder perdido ao encontrar outra criança/ pessoa geralmente mais vulnerável do que eles próprios. A exposição da "penalização" aos outros, atribui ainda pensamentos e sentimentos negativos para o próprio aluno e a mesma conotação dos outros alunos em relação a este, influenciando a auto-estima do mesmo e provocando muitas vezes um ciclo comportamental negativo. Observamos ainda que em algumas crianças, esta repreensão pública traz uma vergonha, uma quebra de auto-estima e de auto-imagem, muito bem disfarçada com uma certa "vaidade" perante os outros alunos, como se a um quadro de honra pertencessem.
- À grande maioria dos restantes alunos, não creio que esta exposição os impeça de ter os seus próprios comportamentos (muitas vezes impulsivos). Mesmo aos que impede, essa atitude é obtida mais por medo do que por respeito e a minha opinião pessoal é que formamos melhores pessoas quando o comportamento é gerado por conhecer os meus limites, os dos outros e saber respeitá-los.  
Em suma, por mais que a intenção seja "boa", acredito que afixação pública traz muito mais desvantagens que benefícios (se é que tem algum!).

A quem estiver interessado, ainda mais algumas dicas:
- Existem vários estudos na área da pedagogia, psicologia, pediatria, neurologia que sustentam a minha opinião.
- Para que esta prática de afixação pública ocorra, ela deve estar incluída no regulamento dos colégios (no caso de colégios particulares) e na grande maioria das vezes é omisso ou não está exposto de forma clara
- Não é contemplada na Lei nº 51/2012 de 5 de Setembro onde pelo contrário, é indicado que o processo disciplinar do aluno é confidencial e poderá ser partilhado apenas com professores, psicólogos, Enc. de educação envolvidos no processo.
- Não é uma prática recomendada/ aceite pela Direcção Regional de Educação

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Estabelecer limites. Permitir sentimentos.


As duas frases do título não estão juntas por mero acaso. Estabelecer limites, permitindo sentimentos é de facto um balanço nem sempre fácil de conseguir, mas essencial ao desenvolvimento de uma criança com uma autoestima saudável.

Nem sempre gostamos de estabelecer limites. Nenhum pai gosta de ver o seu filho triste, aborrecido, frustrado e zangado connosco. No entanto, observamos que uma educação demasiado permissiva, pode gerar uma dificuldade futura da criança gerir a frustração e auto-regular os seus próprios sentimentos.

Por outro lado, o estabelecer limites sem empatia, com autoritarismo, pode levar ao desenvolvimento de crianças pouca seguras na expressão das suas opiniões e sentimentos, que se podem tornar bullies ou vitimas e encontra-se ainda muitas vezes associado a uma maior ocorrência de depressão.

Em suma, as crianças precisam de limites apropriados para um desenvolvimento saudável, mas o modo como eles são estabelecidos faz toda a diferença!

Algumas dicas?

  • Conexão: Crie conexão com o seu filho. É a base para qualquer relação. Perceba o seu ponto de vista. Mostre que reconhece o que ele sente, ainda que tenha que estabelecer o limite. Evite o autoritarismo, aproxime-se, esclareça o limite.
  • Limite não é castigo: Estabelecer um limite é já por si uma lição para a criança. Evite castigos adicionais. Se a criança o entender como um castigo a probabilidade de se revoltar contra ele é maior.
  • Apenas os limites necessários: Demasiados limites torna-se confuso, limitador. Questione as suas crenças. Estou a estabelecer demasiados limites? Todos eles são essenciais?
  • Use comunicação positiva sempre que possível: Em vez de "não podes ver televisão durante tanto tempo!" experimente "podes ver televisão até ao máximo de 30 minutos". Ofereça alternativas.
  • Seja firme nos limites que define: Seja claro e assertivo nos limites que para si são fundamentais. 
  • Esteja atento aos limites dele: Somos muito firmes ao estabelecer os nossos limites, mas será que estamos assim tão atentos aos limites da criança? Que ele faça uma birra enorme no meio do restaurante  ultrapassa os meus limites... mas será que a hora, o cansaço, o ruído presente não ultrapassaram já os limites da própria criança?
  • Permita os sentimentos: É natural que a criança sinta zanga, frustração, decepção, quando estabelecemos um limite e é normal que demonstre esses sentimentos. Se eu reagir a eles com autoritarismo e controlo, isso vai criar ainda mais zanga por parte da criança e fazê-la sentir que estas emoções e sentimentos não são reconhecidos. Reforce sempre o limite, mas se permitir e reconhecer com alguma empatia os sentimentos da criança, vai ajudá-la a direccionar  e gerir o que sente de outra maneira e à medida que vai crescendo vai aprendendo a auto-regular as suas emoções, em vez de as reprimir.